Como é adotar um cachorro resgatado da rua?

Saiba como é ter um animal de estimação em casa: mais precisamente, uma cadela adulta que morou anos na rua. Spoiler: é bom demais.

cão abandonado

Segundo dados da OMS, o Brasil tem cerca de 20 milhões de cães de rua. Isso é basicamente um cão a cada dez habitantes no país.

E muita gente ainda quer comprar um cachorrinho fabricado em um canil.

Se você caiu aqui porque está pensando em adotar um cão de rua, talvez minha experiência recente com isso te ajude a tomar uma decisão.

Você também pode ler meu texto sobre a adoção da Caju, a atração principal deste texto aqui. Minha ideia, agora, é contar como é ter um animal de estimação em casa.

Mas não um qualquer: um adotado após passar anos na rua.

É agora: Como foi feita a adoção

Depois de anos – sim, ANOS – de planejamento, finalmente me senti seguro para ter um cachorrinho em casa. A preferência sempre foi por uma cadela.

Considerando que eu não estava indo ao shopping comprar um enfeite pra colocar na estante, tive todo o cuidado possível antes de decidir que era a hora de fazer a adoção. Sempre digo que, se todo mundo fizesse esse planejamento, a quantidade de cachorros abandonados seria bem perto de zero.

Decisão tomada, perguntei para a minha cunhada, que já havia feito alguns resgates, se ela conhecia pessoas com uma cadela adulta para adoção. Me ofereci para bancar vacinação, castração e o que mais fosse preciso.

No mesmo dia já recebi uma lista de opções. No terceiro dia já estava tudo certo para a cachorrinha chegar na casa nova no final da mesma semana.

Oi, eu sou a Caju!

Ela foi resgatada com vários ferimentos, já que apanhava bastante de outros cachorros na rua. A própria moça que a resgatou já havia cuidado dos ferimentos, das vacinas e da castração.

Adaptação: Os primeiros dias em casa

O primeiro dia foi bem estranho, como deveria ser. Ela ficava alerta aos sons, sempre olhando para a porta esperando que sua resgatadora voltasse.

Mal tocou no prato de ração. Era tudo muito novo, e também muito repentino.

Depois de uns três dias já estava acostumada com o ambiente, os horários (passeio e alimentação) e os sons. Cada dia que passava a Caju aparentava estar mais feliz e confiante. Quando ganhou uma caminha nova, então, se jogou de felicidade.

Por falar em caminha, ela dorme bastante. Nas primeira semanas, então, ela praticamente só dormia. Isso é normal para um cão de rua – lá eles dormem pouco por causa de ameaças, barulho e do ambiente em si

No geral, foi tudo muito tranquilo.

Caixinha de surpresas: temperamento e doenças

O que esperar de uma cadelinha que viveu de 3 a 5 anos na rua, apanhando de cachorros e possivelmente de humanos também?

Medo e, por consequência, uma certa agressividade.

É comum que depois de um tempo o cachorro comece a testar quem está na casa e ver quem é o alfa. Como estudei muito a respeito sobre isso, sempre tive o cuidado de mostrar que era eu quem mandava por ali. Comandos, horários para comer (sempre depois de mim) e repreensão e castigos quando preciso.

Ela não entendia muito bem o conceito de brincadeiras e não gostava muito que a gente se aproximasse dela, principalmente quando estava em sua caminha – seu território.

Tentou avançar em mim algumas vezes nas primeiras semanas e sempre rosnava quando eu me aproximava de sua cama. Isso durou pouco tempo, já que eu sempre demonstrava que eu não era uma ameaça, além de repreender e deixar de castigo quando a coisa passava dos limites.

Hoje a Caju me respeita totalmente, mas ainda falta uma socialização para que ela perca o medo de outras pessoas e principalmente cachorros. Ela ainda rosna pra minha namorada, por exemplo, que está aqui todos os dias. Mas nunca mordeu nem avançou – no máximo uns latidos.

Não é de partir o coração?

E o que esperar de uma cadelinha que viveu de 3 a 5 anos na rua, sem cuidados com saúde e alimentação?

Problemas de saúde.

Além de todas as feridas, ela estava com uma alergia bem forte na pele, o que ocasionava uma coceira constante. Depois de um tempo detectei dois tumores, o que detalhei no post sobre mastectomia canina.

Melhor hora: Brincadeiras e passeios

O que é brincadeira?

Caju

Ela não fazia a menor ideia de o que eram brinquedos e de como brincar. Nos primeiros dias, só correr e pular – e olhe lá.

Levou quase um mês para ela mostrar interesse em um bicho de pelúcia. Eu sempre o colocava em sua cama, mas ela nunca dava atenção. Depois de muita insistência, ela começou a correr atrás, morder e tentar destrui-lo.

Com a corda, então, foram quase dois meses de tentativa. A Caju estava aprendendo a ser um cachorrinho e não mais um bicho de rua, finalmente.

Hoje ela ainda não entende muito bem a ideia de buscar algo que é jogado e deixar a gente jogar novamente. Ela até busca, mas fica mordendo – até quando é uma bolinha – e puxa da nossa mão quando tentamos pegar. Claro que isso não é um problema, é até engraçado.

Os passeios, por outro lado, nunca foram complicados. Ela sempre gostou de sair na rua, até porque era seu banheiro oficial.

Sozinha em casa: mobília e sujeira

Nos primeiros meses a Caju não mexia em absolutamente nada ao ficar sozinha em casa. Também nunca chorou, e raramente fica tentando sair de casa quando abro a porta.

Depois de um tempo ela começou a dar mais trabalho. Já espalhou lixo pela casa e até mesmo arrombou o saco de ração. Certamente uma bagunça proposital, um protesto por ter de ficar sozinha.

Por outro lado, nunca nem tocou nas mobílias. E as necessidades ela só faz na rua, mesmo estando muito apertada. Passeamos 2x por dia.

Obediência: comandos e respeito

No começo ela não entendia comando algum, é claro. Mas em dois meses já sabia sentar, ficar, esperar a hora de comer e vir. Também entende o que é “passear” e “papar”, e faz a maior festa quando escuta essas palavras.

Ela também sabe exatamente onde deve ficar em cada situação, seja hora de comer ou de dormir. E nunca fez escândalo na hora de colocar a coleira ou roupinhas.

Claro, no começo foi mais difícil explicar que ela não poderia subir no sofá (hoje ela tem o espaço dela por lá, com uma proteção), e na cama ela não consegue subir.

Ela entende muito bem o “não”, principalmente quando sou eu quem diz. Foi a primeira coisa que aprendeu, inclusive – antes mesmo de “Caju”, seu nome.

Melhor parte: Companheirismo e gratidão

Como você pode ver, tirando os sustos e um trabalhinho ou outro, foi tudo bem tranquilo. Só preciso esconder o lixo na hora de sair e eventualmente repreender para que ela não suba em sua caminha com petiscos.

Normalmente cães de rua têm uma ideia melhor de limpeza em relação a necessidades fisiológicas. Eu até tentei treiná-la para usar um tapete higiênico, mas não tem jeito: ela prefere fazer sujeira na rua. Às vezes até parece que ela escolhe a calçada mais suja pra fazer xixi ou cocô.

Toda vez que chego em casa é uma festa, nem que eu tenha descido só pra pegar uma carta na portaria. E em casa, onde eu estou, a Caju está. Se chego perto, o rabinho já começa a balançar.

Parece até que, se ela falasse, seria um “obrigada” a cada 15 minutos.

Ninguém merece isso.

Não compre. Adote!

Se você pensa em comprar um cão de raça só porque é “melhor” para apartamento, precisa repensar seus conceitos: cada cão tem sua personalidade, e educá-los quando filhotes é muito mais difícil.

Cães adultos (até mesmo idosos) podem ser treinados, são ótimas companhias e muito inteligentes.

Tentei deixar o texto bem pessoal e informal pra passar exatamente minha experiência com adoção. Se você também adotou um vira-latas, deixe seu comentário contando sua história. Inspiração nunca é demais!

Formado em Publicidade e Propaganda e Design de Publicidade, trabalha com web design e desenvolvimento, mas sempre arruma um tempo pra ler, estudar e escrever sobre cães. Atualmente mora com a Caju, vira-latinha resgatada da rua.
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